sobre as Obras Escolhidas de Álvaro Cunhal
Dos ensaios políticos<br> às cartas e entrevistas
A Editorial Avante! prevê para este ano o início da publicação das Obras Escolhidas de Álvaro Cunhal em seis volumes. O editor Francisco Melo fala dos critérios que estão a ser utilizados, dos conteúdos das obras e do seu significado para o PCP no passado, no presente e no futuro.
Quais os critérios que presidiram à escolha das obras para esta edição?
Evidentemente que quando se escolhe, escolhe-se o melhor… O que no caso vertente é um critério de difícil aplicação, diga-se! Mas para ser mais concreto, direi que se procurou escolher aqueles textos que fossem, por um lado, representativos e, por outro, historicamente marcantes das diferentes fases e diversas facetas da produção teórica de Álvaro Cunhal, podendo ir de uma carta, de um artigo, de uma entrevista, de um discurso a um relatório ou a um livro.
Mas, além destes critérios gerais, outros tiveram que ser estabelecidos para resolver problemas que a própria aplicação daqueles levantava. Trata-se de questões como esta e que é da maior importância: incluir ou não obras não assinadas pelo autor ou mesmo subscritas por organismos dirigentes do Partido — e isso pode dever-se a razões políticas diversas —, mas que sabemos por testemunhos escritos ou orais inquestionáveis (e até bastaria para o determinar a análise do seu conteúdo, estilo, etc.) serem da autoria de Álvaro Cunhal ou quase integralmente de sua autoria. A resolução tomada foi de os incluir, embora com a diferenciação — e é a única — de figurarem como anexos. Não o fazer seria apoucar, mutilar a verdadeira dimensão da sua produção teórica e do seu papel sem paralelo na vida e na história do nosso Partido.
Qualquer objecção a este critério só poderia ser de natureza meramente formal e poder-se-ia com a mesma validade contra-argumentar que, então, muitos textos assinados não o deveriam ter sido por terem resultado de uma experiência colectiva e de contribuições diversificadas e terem sido mesmo submetidos à apreciação e aprovação de órgãos dirigentes do Partido, podendo portanto ter sido, e certamente o foram, objecto de alterações. Para concluir sobre este aspecto, é ainda de salientar que os textos não assinados incluídos nesta edição, embora de grande significado, estão longe de dar a ideia da totalidade da riqueza da intervenção político-ideológica de Álvaro Cunhal.
Pelo que acabas de dizer, podemos concluir que se trata de uma edição crítica das obras de Álvaro Cunhal?
Não, não. Isso é um trabalho que requererá ainda uma investigação aprofundada, nomeadamente quanto à sua produção teórica anterior ao 25 de Abril.
Abriria aqui um parêntesis para dizer que repudiamos veementemente todas as especulações e calúnias anticomunistas sobre a história do Partido. Mas sabemos distinguir o trigo do joio: isto é, distinguimos o que é conhecimento histórico factual (e são bem-vindas todas as contribuições nesse campo, fértil…) do anticomunismo apriorístico e da falsificação intencional..
É claro que este tema nos levaria muito longe e ultrapassa o âmbito desta entrevista. Por isso voltarei à pergunta para dizer, de um modo sintético: não se trata, como dissemos, de uma edição crítica, mas de uma edição que procura ser rigorosa quanto à fixação dos textos e com abundantes notas informativas de modo a que os leitores menos conhecedores possam assimilar o que é fundamental sem a perturbação, a dificuldade, digamos assim, do circunstancial datado e desconhecido.
Mas julgo que ainda tinhas algo a dizer sobre os critérios…
Sim, houve ainda outros problemas, embora menos importantes, sobre os quais tivemos que estabelecer critérios. Por exemplo, como em geral acontece, as diferentes obras estão organizadas em cada volume por ordem cronológica. Mas pode ser a cronologia da sua elaboração ou da sua publicação. Aqui adoptou-se um critério diferenciado. Se se trata de uma obra que foi publicada muito tempo depois da sua elaboração mas que não foi objecto de alterações posteriores (como é o caso, por exemplo, do livro Acção Revolucionária, Capitulação e Aventura, escrito em 1967 mas só publicado em 1994 no seu «texto original e integral», como se afirma no Prefácio), então a decisão foi de o inserir tendo em conta a data da sua redacção. Porém, se se trata de uma obra cujo texto originário foi revisto, actualizado ou aumentado quando da sua ulterior publicação (o caso mais relevante de todos é o ensaio O Homem, o Artista e a Sociedade, em cujo Prefácio o seu autor expressamente declara que a data deste seu ensaio é a data do prefácio da sua edição em Julho de 1996), então aparecerá incluída de acordo com a data da sua publicação.
Uma outra questão a resolver foi a de que edição ou versão da mesma obra, ou mais rigorosamente dito, da obra com o mesmo título, publicar. Neste caso optou-se por editar a versão mais elaborada, mais recente, desde que essa versão tenha sido redigida pelo autor originário. Esta ressalva deve-se ao facto de haver casos de obras, como a Célula de Empresa, que foram reeditadas com alterações, cortes e acrescentos que não foram feitos pelo autor originário.
Entre as obras seleccionadas estão algumas das que publicou com o pseudónimo Manuel Tiago?
Não. Como se sabe, e por razões também conhecidas, Álvaro Cunhal só utilizou o pseudónimo Manuel Tiago em obras de ficção. Ora a presente edição visa dar a conhecer a sua obra teórica, a sua obra de intervenção político-partidária e ensaística. A sua produção literária é qualitativamente diferente, ainda que tributária quanto à matéria-prima, digamos assim, da actividade e da experiência riquíssimas do seu autor como militante e dirigente partidário.
A propósito diga-se que não está fora das nossas perspectivas editoriais a edição do conjunto da sua obra ficcional de um modo formalmente idêntico ao da edição em preparação da sua obra política.
Serão publicados textos inéditos?
No sentido estrito do termo, não. Sempre foi essa a vontade declarada do camarada Álvaro Cunhal relativamente aos seus estudos, apontamentos, notas, etc., que não publicou em vida — nomeadamente pelo seu carácter inconcluso, fragmentário ou de conteúdo não devidamente apurado e fundamentado, para não falar já dos de natureza pessoal. Essa vontade será respeitada.
Mas publicaremos textos quer de conhecimento ainda hoje muito restrito, quer que muito poucos camaradas (e não só) sabem ser de sua autoria, como já foi referido. Dos primeiros podemos citar, a título de exemplo, textos da sua juventude ou os elaborados no âmbito da sua viagem à URSS via Jugoslávia em finais de 1947 e princípios de 1948 ou ainda cartas enviadas da prisão e outros documentos prisionais dos anos 50. Dos segundos mencionaremos, também a título meramente exemplificativo, escritos de índole diversa mas igualmente marcantes na história do nosso Partido como A Célula de Empresa, Se Fores Preso, Camarada..., A Tendência Anarco-Liberal na Organização do Trabalho de Direcção, O Desvio de Direita no PCP nos Anos de 1956-1959, etc.
Evidentemente que quando se escolhe, escolhe-se o melhor… O que no caso vertente é um critério de difícil aplicação, diga-se! Mas para ser mais concreto, direi que se procurou escolher aqueles textos que fossem, por um lado, representativos e, por outro, historicamente marcantes das diferentes fases e diversas facetas da produção teórica de Álvaro Cunhal, podendo ir de uma carta, de um artigo, de uma entrevista, de um discurso a um relatório ou a um livro.
Mas, além destes critérios gerais, outros tiveram que ser estabelecidos para resolver problemas que a própria aplicação daqueles levantava. Trata-se de questões como esta e que é da maior importância: incluir ou não obras não assinadas pelo autor ou mesmo subscritas por organismos dirigentes do Partido — e isso pode dever-se a razões políticas diversas —, mas que sabemos por testemunhos escritos ou orais inquestionáveis (e até bastaria para o determinar a análise do seu conteúdo, estilo, etc.) serem da autoria de Álvaro Cunhal ou quase integralmente de sua autoria. A resolução tomada foi de os incluir, embora com a diferenciação — e é a única — de figurarem como anexos. Não o fazer seria apoucar, mutilar a verdadeira dimensão da sua produção teórica e do seu papel sem paralelo na vida e na história do nosso Partido.
Qualquer objecção a este critério só poderia ser de natureza meramente formal e poder-se-ia com a mesma validade contra-argumentar que, então, muitos textos assinados não o deveriam ter sido por terem resultado de uma experiência colectiva e de contribuições diversificadas e terem sido mesmo submetidos à apreciação e aprovação de órgãos dirigentes do Partido, podendo portanto ter sido, e certamente o foram, objecto de alterações. Para concluir sobre este aspecto, é ainda de salientar que os textos não assinados incluídos nesta edição, embora de grande significado, estão longe de dar a ideia da totalidade da riqueza da intervenção político-ideológica de Álvaro Cunhal.
Pelo que acabas de dizer, podemos concluir que se trata de uma edição crítica das obras de Álvaro Cunhal?
Não, não. Isso é um trabalho que requererá ainda uma investigação aprofundada, nomeadamente quanto à sua produção teórica anterior ao 25 de Abril.
Abriria aqui um parêntesis para dizer que repudiamos veementemente todas as especulações e calúnias anticomunistas sobre a história do Partido. Mas sabemos distinguir o trigo do joio: isto é, distinguimos o que é conhecimento histórico factual (e são bem-vindas todas as contribuições nesse campo, fértil…) do anticomunismo apriorístico e da falsificação intencional..
É claro que este tema nos levaria muito longe e ultrapassa o âmbito desta entrevista. Por isso voltarei à pergunta para dizer, de um modo sintético: não se trata, como dissemos, de uma edição crítica, mas de uma edição que procura ser rigorosa quanto à fixação dos textos e com abundantes notas informativas de modo a que os leitores menos conhecedores possam assimilar o que é fundamental sem a perturbação, a dificuldade, digamos assim, do circunstancial datado e desconhecido.
Mas julgo que ainda tinhas algo a dizer sobre os critérios…
Sim, houve ainda outros problemas, embora menos importantes, sobre os quais tivemos que estabelecer critérios. Por exemplo, como em geral acontece, as diferentes obras estão organizadas em cada volume por ordem cronológica. Mas pode ser a cronologia da sua elaboração ou da sua publicação. Aqui adoptou-se um critério diferenciado. Se se trata de uma obra que foi publicada muito tempo depois da sua elaboração mas que não foi objecto de alterações posteriores (como é o caso, por exemplo, do livro Acção Revolucionária, Capitulação e Aventura, escrito em 1967 mas só publicado em 1994 no seu «texto original e integral», como se afirma no Prefácio), então a decisão foi de o inserir tendo em conta a data da sua redacção. Porém, se se trata de uma obra cujo texto originário foi revisto, actualizado ou aumentado quando da sua ulterior publicação (o caso mais relevante de todos é o ensaio O Homem, o Artista e a Sociedade, em cujo Prefácio o seu autor expressamente declara que a data deste seu ensaio é a data do prefácio da sua edição em Julho de 1996), então aparecerá incluída de acordo com a data da sua publicação.
Uma outra questão a resolver foi a de que edição ou versão da mesma obra, ou mais rigorosamente dito, da obra com o mesmo título, publicar. Neste caso optou-se por editar a versão mais elaborada, mais recente, desde que essa versão tenha sido redigida pelo autor originário. Esta ressalva deve-se ao facto de haver casos de obras, como a Célula de Empresa, que foram reeditadas com alterações, cortes e acrescentos que não foram feitos pelo autor originário.
Entre as obras seleccionadas estão algumas das que publicou com o pseudónimo Manuel Tiago?
Não. Como se sabe, e por razões também conhecidas, Álvaro Cunhal só utilizou o pseudónimo Manuel Tiago em obras de ficção. Ora a presente edição visa dar a conhecer a sua obra teórica, a sua obra de intervenção político-partidária e ensaística. A sua produção literária é qualitativamente diferente, ainda que tributária quanto à matéria-prima, digamos assim, da actividade e da experiência riquíssimas do seu autor como militante e dirigente partidário.
A propósito diga-se que não está fora das nossas perspectivas editoriais a edição do conjunto da sua obra ficcional de um modo formalmente idêntico ao da edição em preparação da sua obra política.
Serão publicados textos inéditos?
No sentido estrito do termo, não. Sempre foi essa a vontade declarada do camarada Álvaro Cunhal relativamente aos seus estudos, apontamentos, notas, etc., que não publicou em vida — nomeadamente pelo seu carácter inconcluso, fragmentário ou de conteúdo não devidamente apurado e fundamentado, para não falar já dos de natureza pessoal. Essa vontade será respeitada.
Mas publicaremos textos quer de conhecimento ainda hoje muito restrito, quer que muito poucos camaradas (e não só) sabem ser de sua autoria, como já foi referido. Dos primeiros podemos citar, a título de exemplo, textos da sua juventude ou os elaborados no âmbito da sua viagem à URSS via Jugoslávia em finais de 1947 e princípios de 1948 ou ainda cartas enviadas da prisão e outros documentos prisionais dos anos 50. Dos segundos mencionaremos, também a título meramente exemplificativo, escritos de índole diversa mas igualmente marcantes na história do nosso Partido como A Célula de Empresa, Se Fores Preso, Camarada..., A Tendência Anarco-Liberal na Organização do Trabalho de Direcção, O Desvio de Direita no PCP nos Anos de 1956-1959, etc.